sábado, 7 de maio de 2016

Assistindo a um documentário no canal Arte 1 sobre a história dos violinos Stradivarius e penso cá comigo como o músico é mais sortudo que o ator. O violino supera o músico. Mas não porque o violino seja 'melhor' do que o músico, senão porque o violino é anterior ao músico. É nisso em que o violino é superior ao músico: ele já existe previamente a quem irá tocá-lo. E o músico só será um músico de qualidade caso consiga dar passagem ao som que já está contido como potência no seu violino. O som do violino já pertence ao violino, é dele! O bom músico é aquele que faz o seu violino tocar. Ele que toca só toca para que o violino toque... Com o ator essa consciência de estar a serviço do ofício é tão falha. A personagem - que deveria ser o violino do ator - é quase sempre um argumento abstrato que só é importante como mero pretexto para que o ator brilhe. O ator, ao contrário do músico, não tem em o que se apoiar, não há instrumento com que dialogar, é ele próprio o seu instrumento, um instrumento invisível, íntimo, e quase sempre vaidoso ao grau de cegar o ator para tudo o que o cerca. O ator, que antes portava máscaras - essa sim, a máscara, um instrumento tangível tal qual é o violino para o músico -, hoje, em quase a totalidade do seu trabalho, tem de lidar com uma solidão espetacular: ele com sua personagem, que não é nada, só letras impressas, nada para se tocar. Ou é possível tocar as palavras? Até acredito que seja, mas quanta diferença para com o músico, que já guarda dentro do seu instrumento a poesia que necessariamente já está pronta, somente à espera de quem a saiba cantá-la.

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