sábado, 21 de maio de 2016

A maior das bênçãos da qual o ator é portador é que é dever dele ser ridículo em seu ofício. E quanto mais ridículo melhor. Quer coisa mais ridícula que um ator recitar o 'ser-ou-não-ser-eis-a-questão' diante de uma plateia, tentar convencer a todos de que estamos na Dinamarca, e que ele não é o Fulano-de-Tal e sim o próprio Hamlet encarnado? Coisa pateticamente ridícula. E esse ridículo é pedagógico. Porque viver o ridículo é precaver-se dele fora do campo da ficção, onde ser ridículo pode ser - e é na maioria das vezes - um grandessíssimo atestado de burrice. Porque chacoalhar um pato amarelo de borracha exigindo o fim da corrupção - e acompanhado de outros chacoalhadores de patos de borracha amarelo - é algo, no mínimo, estupidamente ridículo. A cena é ridícula. E é um ridículo da pior espécie que pode haver de ridículo porque é uma cena emoldurada sem a consciência do ridículo da qual o ator lança mão em cada passo que dá quando ele entra em cena. O ator é um ser iluminado porque faz teatro e tem consciência do teatro, e sabe o precioso significado de ser ridículo dentro e fora dele. Saber quando vale a pena ser-ou-não-ser-ridículo é uma pérola de valor inestimável. Eis a questão.


...


...

Nenhum comentário:

Postar um comentário