quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Uma peça de teatro é só uma peça de teatro. Se fosse uma ponte, deveria precaver-se de não ruir. Se fosse um prédio, que fosse sólida o suficiente para não desmoronar. Um veículo de transporte? Então haveria de sustentar as engrenagens e assim evitar enguiçamentos. Uma peça de teatro não é nada disso. Não responde a urgências ou utilidades concretas. Uma peça de teatro não responde a utilidade alguma. É só e tão somente uma peça de teatro. Não carrega expectativas prévias, não promete soluções futuras, não traz consigo manual algum de funcionamento. Uma peça de teatro é só uma peça de teatro que começa, dura, e acaba. É nessa transitoriedade efêmera onde finca o seu direito de existência. Não é preciso conferir outro grau de necessidade e importância a uma peça de teatro do que aquele materializado num sopro que se dissolve no ar. E caso imaginamos que um sopro que se dissolve no ar é pouco para uma peça de teatro é porque ainda não entendemos o que é um sopro, tampouco entendemos o que é uma peça de teatro. A rigor, tudo isso tem a ver com uma certa consciência do que é a vida. Uma peça de teatro é uma pequena caixinha de música que recupera concretamente a insignificância da nossa importância. O sopro é dessa qualidade. Não somos solistas de orquestra alguma. Não somos protagonistas de nada. Não temos direito a reivindicar monólogos ou plateias que nos aplaudam. Uma peça de teatro é só uma peça de teatro. E a sua relevância está justamente em provar que é apenas um sopro que se desmancha no ar. O ator é feito dessa matéria de consciência da sua inutilidade, de ser ele, o ator, mais uma minúscula haste metálica no meio de uma igualmente minúscula caixinha de música.



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