Pequena anti-lição pedagógica aos atores, contrariando
as palavras (palavras, palavras...) ditas por Hamlet:
- Quando
subires ao palco, não queiras dizer nada, para isso já existem os trecos
digitais que evocam todo e qualquer sentimento acumulado e ideias imprestáveis
aos ouvidos de uma audiência viva... Queiras apenas, e ao contrário, ser
esquisito; e esquisito na medida suficiente até o ponto de compreenderes que é
impossível existir desse mesmo jeito esquisito que soubeste criar fora dos
limites das tábuas. Diga apenas o que é preciso ser dito e que já está escrito
para que o digas. Não aja naturalmente, para isso é que servem as aulas de
etiqueta nas esquinas da vida e os laboratórios infinitos de psicodramas
fajutos. Aliás, esqueça da natureza, ela só não é mais chata que a tua chatice
de querer equipará-la. É aconselhável que tenhas voz, corpo e um mínimo de
delicadeza nos movimentos. Mas só para desajustá-los a qualquer medida
conhecida. Seja o dono de novas escalas de expressão e, por Deus!, não imites o
chororô que virou gramática melodramática dos péssimos atores tarimbados pelo
Close-Up da imagem. Por tudo o que é mais sagrado, não contamines a plateia com
crises tuas, dores também tuas, desejos íntimos só teus, como se alguém,
masoquista o suficiente, resolvesse querer sair de sua casa para ver-te assim,
a renderes lágrimas ao vosso ego afetado. Saiba disfarçares a ti mesmo, a
esconderes de quem és quando apareces trajado de Édipo Rei, Mephistópholes,
Ariel ou o que o seja. Acredita no poder da máscara e faça tantas caretas
quanto puderes a fim de apagar da memória que teu nariz é o teu nariz, a tua
boca é a tua boca, e o teu cabelo é esse que penteias todas as vezes em que
abandonas teu lar. Tenha em mente que é preciso tornares a ti mesmo um gigante,
com estatura de gigante, voz de gigante e brados de gigante de fazer inveja ao
mais surdo dos pregoeiros públicos. E manda às favas o desejo de encontrares a personagem
fora daquilo que ela já se mostra ser: um belo dum punhado de palavras a espera
de quem as mastigue! Não há um antes e um depois! Perder tempo a decifrar a
personagem no invisível do que não existe é, no máximo, um belo dum pretexto
para os péssimos atores gastarem verbos com justificativas mil para a sua inata
falta de talento. Inventa o que não existe. E, se tudo já tiver sido inventado,
finja que és o inventor daquilo que roubas...
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...
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