sábado, 5 de dezembro de 2015

Saímos sempre de cena. Sumir para um ator de teatro é a coisa mais natural do mundo. A rigor, existimos só para isso: para sumir. Os entreatos de aparições são sentenças programadas de sumiços iminentes. Para nós, atores de teatro, a morte é experimentada a todo instante, a cada palavra perdida no espaço, a cada troca de luz, a cada movimento da cortina. O eterno para nós, atores de teatro, é a exata medida dos esquecimentos que deixamos impressos em cada palmo dos palcos onde pisamos. Nosso legado é a memória de que um dia existimos, sem desejos outros de impérios permanentes, sem registros fora da lembrança, sem legados infinitos. Temos a sorte de ver a vida sendo vivida dentro de um ofício que não deixa enganar a real essência da natureza humana. É tudo de mentira! Nossa única transcendência possível é talhada na matéria concreta. Nosso evangelho é impresso nas folhas da imaginação e lido com os lábios zombeteiros da criança que compreende a insignificância de tudo quanto é tido como sério, grave e urgente. Somos todos nós, atores e não atores, ridículos e maravilhosos ao mesmo tempo. Crápulas e santos. Sábios e mentecaptos. Cínicos e ingênuos. Ser ator de teatro é conviver com o desespero de se saber minúsculo frente ao tamanho do mundo. Personagem dentro de um palco maior que estabelece qual máscara é a mais adequada para determinada ocasião. E é por essa consciência, a certeza de nossa espetacular impotência, que uma grandeza de encher os olhos faz-se brotar dentro de cada um de nós. Que sorte a minha essa a de ser ator.  

Marília Pêra, uma das maiores do nosso teatro.



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