domingo, 6 de dezembro de 2015

O ator contemporâneo, parece-me, é o emblema supremo do vazio ao qual chegamos. Símbolo oco de uma era do marketing e da propaganda, é ele, o ator contemporâneo, o protagonista de tudo. Convocado a aparecer, a opinar, a servir de exemplo para campanhas humanitárias, a dar bom dia quando é bom dia - e boa noite quando é boa noite -, é ele, o ator contemporâneo, uma espécie bem lapidada de bom moço de dentes brancos e cabeleira penteada. E revela-se o tempo inteiro. O ator contemporâneo, assim como o cidadão ideal que atravessa as nossas ruas de hoje, é alguém cuja intimidade é devassada em praça pública porque é obrigação verter lágrimas e sentimentos ao mundo. E é admirável quando o ator contemporâneo sente, diz a verdade, abre-se em suas entranhas em plena praça pública. É lei convocar o outro para testemunha daquilo que eu sou, sinto e penso. O ator, que antes escondia-se porque era tímido, retraído, avesso à luz, agora não abre mão de um refletor que o siga até quando decide ir comprar pão na padaria da esquina. A máscara que o escondia porque era função do ator esconder-se para dar passagem à personagem, hoje é quase apetrecho de decoração. A personagem virou consequência, não matéria prima da mentira da qual a poesia é forjada. Aliás, qual poesia que se sustenta hoje? Quem são aqueles que desejam encantar-se? Há encanto que sobreviva a tanta megalomania do ego dilatado?
Triste do ator que aparece e não reconhece o poder maravilhoso da sombra, do silêncio, do anonimato.


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