sábado, 24 de outubro de 2015

Um violino e um arco bons e é tudo o que é preciso para ser um bom músico. O papel do bom músico é não atrapalhar o violino e o arco bons. E é essa a grande jornada a ser empreendida: NÃO ATRAPALHAR O QUE JÁ EXISTE, deixar passar através de si o instrumento. Não há bom músico sem que haja bom instrumento. E o péssimo músico é sempre aquele dedicado a aparecer para dar a sua voz ao violino. Nem com um Stradivarius na mão o péssimo músico daria conta de se tornar um bom músico. E o mesmo procede com o bom músico caso ele tenha em sua posse um péssimo violino. É necessário que o mundo já exista para que seja possível existir nele em toda a potência que nos cabe existir. O mesmíssimo ocorre com os atores, mas dessa vez com um prejuízo latente: o ator não tem à sua disposição um objeto como é o violino para o músico. Então, a equação ganha contornos ainda mais delicados porque o ator, na maioria das vezes não tendo no que se apoiar senão em si mesmo, é quase sempre compelido a MERGULHAR DENTRO DE SI, a SER ALGUÉM, a CRIAR PERSONALIDADES, a PRODUZIR SENTIMENTOS e FORJAR INTIMIDADES QUE O PERMITAM EXISTIR, que deem conta de uma psicologia abstrata, longe do mundo que o cerca. Esse ator afetado pelo sensível das suas entranhas é exatamente a reprodução do péssimo músico: QUER APARECER, faz FORÇA PARA APARECER, e esquece do mundo, dos outros, daquilo que o toca materialmente e concretamente. O bom ator é como o bom músico: delegam ambos ao universo (um universo já constituído em bases sólidas) a razão e motivo de suas forças criativas. O bom músico e o bom ator são, ambos, fantasmas conscientes: somem de si próprios para poderem vibrar no espaço. E é o que basta!

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