domingo, 11 de outubro de 2015

Eu tenho uma tese! A personagem existe porque o ator em 100% das ocasiões é de uma falta abissal de talento para ser minimamente interessante. Porque é de praxe sermos absolutamente desinteressantes na vida, quer sejamos atores ou não atores. Mas, ao ator - mais do que a qualquer outra pessoa - é concedida a preciosa dádiva de, pelo intermédio da graça da personagem, sumir, escafeder. Pó de pirlim-pim-pim para os atores! Saída à francesa para os atores! Sejamos francos! Ser quem somos já é de um desperdício de existência monumental, afinal, quantos de nós não são quem são imaginando que esse quem somos é único, divertido, sagaz, inteligente e especial, quando, na mais crua das verdades, somos tantos quantos os outros já o são e o foram, areia do mesmíssimo saco dos tempos imemoriais, marionetes enferrujados do mesmo artesão exaurido por tanto duplicar os mesmos moldes? Então, que maravilha de benção carrega consigo o ator! Ao ator cabe esse miraculoso milagre de livrar-se momentaneamente da sua insignificância ao dar chance a um sumiço salvador. Por isso que é duplamente escatológico quando justamente o ator, esse mesmo que tem a rara chance de compreender o teor da essência de que somos feitos, faz uso do seu ofício para ele próprio reforçar a sua condição de ator, ocupado com os seus vícios de ator, seu charme insuportável de ator, dono daquela simpatia de ator que só os atores, por serem desinibidos - ou exibidos - conseguem ter, e tudo feito e programado para que os outros, cobaias exemplares dos atores, o aplaudam em sua vaidade de ator; enfim, essa coisa-ator que quando existe para ser o protagonista da atenção alheia naufraga toda e qualquer possibilidade de redenção da poesia, e também do homem nela envolvida...
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