quinta-feira, 5 de junho de 2014

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Parece-me incrível encontrar alguém que goste de teatro e odeie futebol. Os dois terrenos, para mim, são irmãos-gêmeos, sem tirar nem por. Tanto o teatro quanto o futebol tratam de elevar as questões humanas - tirando-as desse pasto insosso da sisudez politicalóide-argumentativa - para o patamar do arbitrário, do efêmero. Os dois campos, o palco e a grama, valorizam o ato irresponsável, a irreverência de zombar do tempo futuro das promessas ao concentrar no instante um determinado gozo patético, sem qualquer razão ou propósito que não seja o de desfrutar o 'sem sentido das coisas'. Paradoxalmente, está nessa atitude de distância da vida, da afirmação do lúdico, uma das propostas mais efetivas em termos também políticos, coisa capaz de alterar aquilo que na esfera da praça pública - com suas manifestações éticas e morais - não conseguimos nunca dar conta, ou seja, a ideia de que vivemos para o transitório, para aproveitar uma breve passagem por debaixo dos holofotes. E isso nos dá um alcance mais humano para as questões que rondam a periferia do nosso tão egoísta umbigo dramático. Por incrível que pareça, o drible e o ator, o jogador e o intérprete da cena, são exemplares a nós justamente pelo proposital descompromisso de suas ações efetivas. Ganharíamos muito se fôssemos um país mais teatral (futebolístico já o somos!) e menos imbuído dessas lutas partidárias e ideológicas que tanto nos amofinam a cuca para dar em lugar algum.

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