quarta-feira, 13 de agosto de 2014

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Quando o médico que me atendeu ontem soube que eu era ator, lançou-me um sorriso e disse que os nossos ofícios não eram de todo incompatíveis, que ambos, eu e ele, lidávamos com o fingimento. O médico atento ao que o paciente diz sentir mas não sente - só o fazendo para chamar a atenção -, e o ator, que para ser alvo de atenção deve saber fingir aquilo que os outros devem tomar como verdadeiro.

No final das contas ele provou-me que o que eu sentia naquele exato instante - imaginava toda a sorte de moléstias malignas para a minha perna que não desinchava havia dois dias, incluindo uma necrose completa seguida de amputação emergencial... - era a mais ignominiosa mentira! Apenas um trauma muscular simples, nada demais (dei com o focinho no chão!)

Não fosse por uma diferença crucial que o digno doutor não tomara ciência, diria que o médico havia saído com uma goleada para cima de mim. Mas dei o troco, ainda que intimamente e sem compartilhar o que pensava. A razão final é essa: o médico é o extremo oposto do ator! Enquanto o médico esforça-se por curar, nós, atores, não economizamos em produzir a doença. Nossa tarefa, antes de solucionar os agouros humanos, é disseminar toda espécie de vírus e epidemias.

Fui pra casa feliz, e curado daquilo que imaginava ter, e não tinha!




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