segunda-feira, 3 de abril de 2017

Nenhum artista que só é artista porque reúne algum talento que o qualifica como tal celebra o talento que possui, repare! Às vezes, e sem glamorizar a auto flagelação, o talento lhe é um fardo, ou uma obrigação, ou uma tarefa que tem de ser cumprida em regime de urgência, necessidade ou dever. E tudo isso também não é movido pela escala do aplauso, do dinheiro e da celebração. Há no artista que é artista, e que necessita de todo reconhecimento de seu esforço de artista, de toda remuneração e aplausos devidos, um solo próprio de solidão, de intransigência, de uma irreverência e revolta contra qualquer tipo de consenso que possa afastá-lo dessa mesma solidão. Seu beco sem saída é a sua única e possível liberdade. É por ser rarefeito às demandas que forjam o sentido de seu ofício que ele exerce o seu ofício até o ponto de torná-lo público. Esse mesmo artista é aquele justamente que por respeito sagrado e consciente ao que é seu, e somente seu!, consegue transcender sua dor íntima e alcançar o outro. A generosidade de um artista sedimenta-se numa profunda teimosia individualista. Não existe artista representante de uma empresa, não há nada mais insuportavelmente contraditório que um artista pertencer a uma empresa, dessas empresas que expõem o artista para que o tal artista seja festejado, conhecido e aplaudido. Esses tais consagrados artistas podem ser tudo, de bonecos de auditório até animadores de baile de debutantes, de papagaios de ocasião até gurus da autoajuda, mas artista é um atributo tão extraterrestre a eles quanto classificar um pintassilgo de ave de rapina.

Viva o teatro. Viva a solidão do teatro. Viva a penumbra dos bastidores, o silêncio das coxias, o hall vazio depois do público ir embora, a superfície escura do palco depois do apagar dos refletores. Viva!


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