sexta-feira, 25 de novembro de 2016

A gente que sobe sistematicamente às ribaltas para contar uma história desenvolve um certo ceticismo melancólico, nada que nos torne obtusos e rarefeitos às brisas imponderáveis da vida, assim espero. Mas algo como que semelhante a sensação de tranqüilidade frente à esquizofrenia do mundo, a velocidade dos acontecimentos do mundo, ao sorriso largo de quem imagina uma solução possível à nossa miséria, à certeza da tristeza de outros que não conseguem enxergar que o estar triste é um momento igualmente passageiro, assim como o é o sucesso de quem pensa segurar o cetro das atenções. As cortinas que abrem e fecham a despeito do nosso estado de espírito daquele preciso instante em que tudo começa - porque é imperativo que comece quando chega a hora de começar -, dá a nós, atores, uma estranha calma, calma de sermos nós somente uma parte da coisa, não a totalidade dela, de que estar vivo é menos engalfinhar-nos uns aos outros por um lugar ao sol do que achar tranquilamente um pedaço à sombra para ver o que acontece diante dos nossos olhos. É um jeito de agir pela metade, e ser atingido pela dimensão misteriosa e assustadora da plateia. Mas é esse assustar-se que dá a chance de também relaxarmos na confiança de que é assim mesmo, de que será assim mesmo queiramos ou não. Nós, atores da ribalta, carregamos um sentimento machadiano dentro do coração, um fel ácido e irônico, triste e alegre, esperançoso e resignado. Enfim, é mais fácil ser humano - porque ser humano é ser invariavelmente contraditório - quando se é ator de teatro.



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