quinta-feira, 12 de março de 2015

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Talvez de fato nós mereçamos esse troféu: o troféu de pior cinema do mundo. E não por culpa do cinema, que é cinema em qualquer canto do mundo. Mas por culpa só nossa, que por sermos tão ruins em fazer cinema, e por também sermos igualmente fazedores de cinema, acabamos por unir os pontos da equação e, por fim, levantar esse troféu: o de piores fazedores de cinema do mundo. E talvez porque sejamos nós péssimos atores também. E péssimos diretores de atores também. E com tantas péssimas peças, em nada admira que tenhamos o talento para arrancar dos piores argumentos possíveis o substrato de histórias completamente pobres e não menos péssimas, seja porque são elas próprias um poço inesgotável de melodramas fajutos, seja porque nós, ainda que com uma boa e rara história nas mãos, não temos a mais vaga ideia de como contá-la, ou a contamos de forma péssima, destruindo todo e qualquer potencial que nela poderia haver para, de fato, consolidar-se como uma boa história. E talvez sejamos tão ruins porque adoramos querer do cinema essa coisa dele, o cinema, virar uma máquina poderosa produtora de emoções. E por essa razão fazemos do cinema o pior dos cinemas possíveis: porque sentimos que é o sentimento a pedra de toque que se esconde nas boas histórias. E assim procedemos como espremedores de esponja, torcendo ao avesso qualquer narrativa na esperança de extrair dela as lágrimas prometidas. Talvez, de fato, esse troféu, o troféu de pior cinema do mundo, pertença a nós, e tenhamos mesmo que erguer os nossos punhos para apanhá-lo com orgulho e merecimento. E tal troféu não só diz respeito a nós, aos fazedores de cinema que somos, mas também ao público de cinema que também somos. Porque enquanto espectadores, adoramos sorver desse xarope doce da emoção pasteurizada, clamamos por ele, exigimos adocicar a língua com a pasta dos sentimentos impressos na tela. E assim, também viramos péssimos apreciadores de cinema. Ninguém se dando conta de que é o inverso disso tudo que pode, de alguma maneira, produzir alguma emoção digna de sinceridade poética. A secura, a aridez, o vazio das personagens, o silêncio da trilha sonora, a presença ou ausência de cores... São esses alguns dos elementos que, quando combinados, e sem a afetação do desejo de fazer do homem esse arauto lacrimoso de episódios baratos, é que podem chegar a algum horizonte simbólico digno de atenção.

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