quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

Ser ou não ser, eis a questão. A dúvida existencial da personagem encaixa-se perfeitamente à dúvida do ator. E sendo Hamlet um personagem-ator, ou um ator-personagem, as interrogações dão-se as mãos. E se é difícil responder a questão sob a ótica do ser humano, já que somos quase sempre personagens em constante movimento, e, por isso mesmo, de difícil análise, deslocando o eixo para o ator, por outro lado, a resposta torna-se mais tranquila. Não sejamos, eu diria! Ser é pedantismo demais, é botar-se em primeiríssimo plano, é perder a chance de fingir ser, e não fingindo perder a preciosa oportunidade de nos vermos duplicados, farsantes, gozadores da vida e de nós próprios como tristes personagens agentes da vida, ou da pouca fatia de vida que nos cabe. Esse suicídio voluntário, e simbólico, é exercício de inteligência, sarcasmo, e também de potencialidade da emoção, mas não mais dessa emoção intimista que a tudo convoca para o centro emotivo que emana de nós, mas uma outra emoção, um sentir para fora e sem a expectativa de chorar as mesmas lágrimas confortadoras que fundam uma individualidade. O nosso eu é engrandecido quando esquecemos periodicamente dele, quando reconhecemos o teatro que há para além de nós ao invés de fazer do teatro uma decorrência da personagem que suspeitamos ser. Não sejamos nunca! Que optemos pela sombra, pelo anonimato, pelo mistério de não compor nada que sustente uma interioridade que possamos considerar nossa. Ser ou não ser, eis a questão... resolvida.


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