sexta-feira, 14 de setembro de 2018

Cada vez mais me convenço de que uma boa preparação para o ator em nada tem a ver com a sua personagem. O ator bem preparado nunca sabe representar personagem nenhuma, quanto mais representar a sua personagem, que é totalmente desconhecida para ele. O bom ator é aquele que é bem preparado para dar conta de uma certa trajetória recheada de incógnitas. Na medida em que o ator estiver desocupado dessa coisa chamada personagem, essas dúvidas de percurso estarão em evidência, e somente parte delas poderá ser solucionada pelo contato que haverá com a plateia. Outras permanecerão misteriosas até o fim da temporada. É desse terreno arenoso de desequilíbrio que se ergue o bom ator. E é preciso que seja assim para que haja uma boa peça de teatro. Teatro nunca é um lugar de apresentação de alguma coisa organizada, bem acabada. É o inverso disso. A coisa estará viva e pulsante se souber que nada está garantido, bastando um empurrãozinho para tudo se desmoronar. Bons diretores nunca dirigem atores, muito menos fazem questão de entender essa coisa de personagem. Bons diretores preocupam-se com trajetórias, são bons diretores na proporção exata em que são bons encenadores. Bons atores também, preocupam-se mais com o desenho da cena do que com qualquer coisa que lhes passe pelas entranhas emotivas da personagem. O espaço é muito mais valioso que qualquer ideia abstrata de humanidade.


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